11 de abr. de 2008

Plaft!

Ser professora é algo que muito me realiza, me faz feliz verdadeiramente. Gosto de entrar na sala de aula e olhar pra cada rostinho que me aguarda. E eu definitivamente amo as 5ªs séries. Gosto de ver que há muitas coisas que posso fazer por outras pessoas e perceber que, mesmo tão pequeninas, elas têm muito pra me ensinar.

Ao mesmo tempo que minha felicidade se eleva, alguns rostinhos e marcas começam a apontar na minha realidade

Hoje eu conheci a compaixão gigantesca, talvez algo que eu não havia experimentado ainda, compaixão essa que me foi apresentada por um menino de 13 anos, frequentador da 5ª série, um caso comum no Brasil, mas não tão comum à minha vida.

Quando cheguei na sala de aula, não percebi nada de diferente. Passei o objetivo da atividade na lousa e até aí tudo bem. Foi somente no momento em que sentei na cadeira que percebi o pequeno abrindo o caderno de desenhos.

- Opa, peraí. E o livro? Não vai fazer os exercícios?

- Professora, professora. Ele só faz desenhos, ele não escreve nada! Consegue copiar letra por letra, mas não entende a palavra.

- Como assim? Como é seu nome?

- Arlindo, pofessora.

- Arlindo, querido, por que você não faz a atividade?

- Eu gosto só de História, da matéria, sabe, pofessora. E de desenho. Gosto mesmo é de desenhar.

- Você não faz atividade por que não quer ou por que não consegue?

- Na outra escola, a pofessora não me ensinava nada, eu sei as letras, mas não consigo juntar elas.
Arlindo tem cinco irmãos, mora num bairro 'carente' aqui da cidade. Ele já contou que não tem escova de dentes e nem sabonete, que já foram providenciados. Arlindo já comeu papel por que tinha fome e não tinha comida. E ele gosta de desenhar.

Arlindo é o menino do rosto manchado, sofrido, com marcas que a vida só mostra pra algumas pessoas. Ele é o menino que precisa de atenção pra não ser mais marginalizado do que já é pela sociedade (e pelos próprios familiares). É o menino que me fez chorar ao escrever sobre ele. E é o menino que despertou a minha sensibilidade para o mundo real, que me colocou fora da bolha em que eu vivia, achando que todo mundo tinha em casa comida e água pra tomar banho.

Arlindo é o menino que me fez perceber que a vida é um soco no estômago, sim! Que ela é implacável e não perdoa os sobreviventes.

Eu havia montado um esquema todo teórico pra explicar que o caso do menino era de alfabetização, mas isso, agora, é o de menos. O meu esquema teórico me mostrou que nenhuma teoria poderá superar a complexidade do ser humano, desde os irmãos que maltratam o garoto até ele, que consegue viver num mundo onde é artista.

Arlindo seria um objeto de tese interessantíssimo se não fosse um SER HUMANO tão necessitado de ajuda e atenção...

Espero do fundo do meu coração que Arlindo seja o protagonista do filme dele.

A minha parte, eu pretendo fazer. Não estudei nada para ser alfabetizadora, mas nada me impede de tentar.

Se depender de mim, o destino tão manjado que esse menino já possui escrito vai ser reformulado e nós vamos conseguir reescrever a história dele.
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"Imaginem todos vocês
Um mundo bom que um beatle sonhou.
Peçam a quem fala Inglês
Versão da canção que John Lennon cantou."
(Toquinho)

8 comentários:

Anônimo disse...

Acho que isso é o mais recompensante em ser professor.
É triste, mas só de saber que podemos fazer algo por alguém, sei lá, parece que estamos fazendo MUITO.

Dois cigarros e um café. disse...

É foda quando a gente percebe que as necessidades dos otros são realmente reais, não a necessidade por bolsa nova, como é o meu caso.

Vc vai conseguir melhorar aexistência desse menino. Estou aqui torcendo :)

Beijundas

Mila disse...

E eu que sou chorona por natureza, penso em como eu vou reagir diante de situações assim, que todo professor acaba enfrentando durante a vida profissional.

Beijos

Anônimo disse...

Muito bom! Ajude mesmo... precisamos de mais professoras como você. E acho que mais gente como esse menino... espero que Deus o ajude a crescer na vida.


Passa no meu blog depois, tem coisa pra vc.

Anônimo disse...

Essa história me emocionou. Conheço alguns Arlindos aqui bem pertinho. E faço o que posso.

Ah... como tem coisa que dá revolta na gente...

Putz...

Bjo, fica bem.

Anônimo disse...

Minha querida "sofressora", senti-me "gostosamente beijado". Obrigado...

Retribuo-os na mesma intensidade.

Anônimo disse...

Estás fazendo bem a tua parte, com competência e com a alma. Estás dando o teu contributo efetivo para que no mundo haja um "Arlindo" a menos!

Atitude é tudo!

Não vou parabenizar, pois, no fundo, esse ato é uma obrigação de cada um de nós, em retribuição ao que recebemos, mas te incentivar a fazer sempre bem a tua parte. Do lado de cá, prometo que vou tentar agir da mesma forma diante dos "arlindos" que a vida nos faz defrontar.

Beijo!

Vinicius Cabral disse...

É... o mundo é cruel, infelizmente tem gente que não encherga isso...

É f*da!

Quanto ao ".com", sempre foi, desde o início...

bjo